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Esta é a ponte Hercílio Luz, hoje ela não comporta passagem de carros e serve só de cartão postal para a cidade.
Florianópolis: entre desterrados e manézinhos
Como a cidade impacta a vida de quem vive nela
Bruxas de Cascaes
Franklin Cascaes é um artista ilhéu que se propunha a traduzir a cultura de Florianópolis. Suas estórias são emblemáticas para a cidade. As lendas falam sobre um local misterioso e mágico. As bruxas se reúnem, atacam pescadores e roubam crianças de seus berços. Segundo a tradição há dois tipos de bruxas; as terráqueas, que o são por opção e as espirituais, por uma maldição. Para fugir de seu destino elas devem ser batizadas.
Florianópolis é a capital de Santa Catarina, mas, para alguns moradores, não tem tanta cara de capital assim. Isso, porque é um lugar único, que mistura o urbano e rural. A ilha é cercada por praias e seu interior cortado por lagoas e rios. Há água para todos os lados. É conhecida como a Ilha da Magia, pelo imaginário místico das bruxas de Cascaes e também pelo feitiço de sua beleza. Cada povo tem um conceito de beleza diferente e, para quem mora em Florianópolis, o belo está ligado à natureza.
Quem é nativo é chamado de Manezinho da Ilha. A maior parte da colonização foi de portugueses, dos açores e da madeira. Por isso haviam muitos “Manuel”s, que na pronúncia portuguesa fica “Manél”, mais um pouquinho e chega-se no mané. São considerados manezinhos
aqueles que são descendentes dos portugueses, apesar de que genericamente seja designado àqueles que nasceram em Floripa. A principal característica dessas pessoas é o sotaque, mas também são conhecidos pelo jeito simples de viver, de pesca e agricultura familiar.
Autora: Júlia Orige

Pousada e restaurante dos Frutuoso

Ponto de parada do barco na Costa da Lagoa

Na praia de Jurerê Internacional, norte da ilha

Museu histórico de Santa Catarina, localizado no Centro, em frente à Praça XV.

Menina na feira de Santo Antônio de Lisboa olhando um expositor de arte "manézinha", com frases típicas do mané da ilha, "Tash tolo?" "Segue reto toda vida"
Florianópolis como cenário de filme
A beleza e a história da ilha foram exploradas no filme "A Antropóloga", que fala sobre uma pesquisadora portuguesa trabalhando com as benzedeiras da Costa da Lagoa.
Saiba mais na reportagem da TV UFSC
Eduardo Frutuoso (38 anos) nasceu e mora até hoje na Costa da Lagoa, onde só é possível chegar de barco, ou pela trilha que dura uma hora e meia desde o centro da Lagoa da Conceição. Ele trabalha nos negócios da família: um restaurante e uma pousada na beira da lagoa. Com a pele queimada do sol e um sorriso no rosto, ele conta que comprou seu próprio barco, um que chega à Praia Mole em 20 min, enquanto o que leva e trás os moradores e turistas leva uma hora. Ele diz que é encantado com a beleza natural da ilha e que morar ali é um sonho, mas que às vezes é preciso ir ao shopping e ao centro para “mudar de ares”. Seu pai, Nilson Frutuoso, vai buscar os clientes para o restaurante de barco, no cais que fica na rua João Pachêco da Costa. O cardápio é recheado de frutos do mar e a comida é bem caseira. A família está ali há gerações e não tem intenção de se mudar, gosta muito do local.
Desde os tempos em que a cidade era uma vila e se chamava Nossa Senhora do Desterro se falou na riqueza da paisagem, há registros escritos e pinturas retratando a exuberância natural da ilha. Padre Antoine Joseph Pernetty fez o primeiro estudo geográfico do local “História Natural da Ilha de Santa Catarina e da Costa do Brasil”, em 1770. Como porto de reabastecimento para navios, Nossa Senhora do Desterro foi retratada em relatos por muitos desses viajantes, que falavam de suas características, de sua fauna e flora. Uma árvore sempre presente nestes escritos é a figueira, que tem uma relação com a história de Florianópolis e seu imaginário, compondo estórias de bruxas e assombrações.
Ainda hoje a cidade é um símbolo de beleza natural, de verde e de água. “E quando se sabe que, embora reduzida a 26% de sua mata original, a Ilha de Santa Catarina ainda é um paraíso verde, tem-se uma base para estimar o que existia” afirma Glauco Carneiro em seu livro “Florianópolis, Roteiro da Ilha Encantada”, de 1987. O desmatamento ocorreu principalmente em nome da agricultura, que era uma das principais atividades de Nossa Senhora do Desterro. Ao longo dos anos a agricultura entrou em declínio e não houve mais perdas significativas de áreas verdes depois da primeira metade do século 20.
A ligação com a natureza é evidente entre os habitantes. No bairro Córrego Grande, na área central da cidade, havia, até 2012, um espaço chamado de “Fazendinha”, onde ficavam vacas e cavalos. A Fazendinha foi comprada e iniciou-se a construção de um condomínio residencial de quatro blocos. De 2010 até 2012 os moradores do bairro se mobilizaram para tentar impedir a obra, que ficou embargada durante dois anos. Ainda hoje, quando os prédios estão sendo terminados, lamentam a perda da Fazendinha. Uma das moradoras é L.G., de 71 anos, ela vive no bairro desde os cinco anos de idade. Diz que tudo mudou, nada mais é o que era: “o progresso chegou”. L. explica que a cidade era muito diferente antes de chegarem a Eletrosul e a universidade federal. A primeira trouxe muitos trabalhadores de fora, já a universidade empregou quem era de Florianópolis. Antes o bairro vivia de agricultura familiar e muitas mulheres usavam o rio para lavarem roupas como serviço. O comércio dependia do centro da cidade, quem tinha plantações ia vender seus produtos no Mercado Público e as lavadeiras também iam até lá entregar as roupas dos seus clientes.
Cesar Monteiro, supervisor de Geodésia do IBGE, se mudou para Florianópolis por causa das praias. Ele nasceu em Lisboa e foi para o Rio de Janeiro com três anos de idade. “O mar passou a fazer parte da minha vida” ele afirma e explica que não gostaria de morar longe da praia. Para ele a ilha é uma capital diferente, com cara de cidade do interior, onde todos se conhecem. “As pessoas ainda têm o hábito de se encontrarem para jogar xadrez na Praça XV ou beber cerveja no Mercado Público” diz Monteiro, que trabalha no Centro.
E é no centro que é possível encontrar mais evidências da história da Ilha de Santa Catarina. A arquitetura carrega a herança portuguesa e o centro muito se assemelha à Lisboa, o que se explica se tiver em conta que foram construídas na mesma época. A capital de Portugal sofreu um terremoto em 1755 e foi reconstruída a partir do projeto de Marquês de Pombal. O centro histórico de Florianópolis segue o padrão de prédios baixos, casarios, ruas estreitas, calçada portuguesa e cores pastéis.
“E quando se sabe que, embora reduzida a 26% de sua mata original, a Ilha de Santa Catarina ainda é um paraíso verde, tem-se uma base para estimar o que existia”
A cidade foi apontada como a capital brasileira com maior índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM), em 2013, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O IDHM é calculado com base em variáveis como segurança, expectativa de vida e educação. Florianópolis chegou a 0,8 de 1,0, valor considerado alto. Por isso muitas pessoas se mudam para a capital, buscando uma vida melhor. O antigo nome, Nossa Senhora do Desterro, faz referência à santa dos desterrados, ou seja, a santa que vê por aqueles que estão longe de sua terra natal. Ainda hoje é uma ilha de desterrados.
Florianópolis mudou muito desde a década de 1960, quando a universidade foi instalada. Passou de uma cidade predominantemente rural para um centro comercial e de produção de conhecimento. Agora é também uma referência em turismo, por sua beleza natural. Essa transformação afetou a vida das pessoas que moram em Floripa. Hoje a ilha abriga 500 mil pessoas. Há muitos estudantes, estima-se que a comunidade acadêmica seja de 40 mil pessoas, a maioria de fora. Para quem já vivia ali, o progresso chegou, carros, o fim das plantações, implantação da educação… Decidir se isso é bom ou ruim fica a encargo de cada um.


Catedral de Florianópolis, arquitetura portuguesa
Movimentação no centro num dia de semana
Ouça Rancho de Amor à Ilha, hino de Florianópolis!
Fontes documentais:
CARNEIRO, Glauco. Florianópolis, Roteiro da Ilha Encantada. Banco Bandeirantes, 1987.
Espinola, Cláudia Voigt. O véu que (des)cobre: etnografia da comunidade árabe muçulmana em Florianópolis – Tese de doutorado pela UFSC, 2005
Esta é a velha figueira da Praça XV:

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